Hormônios em crise
Tratar os ovários policísticos ainda na adolescência pode prevenir futuras encrencas cardiovasculares.
Tratar os ovários policísticos ainda na adolescência pode prevenir futuras encrencas cardiovasculares.
As duas fábricas
de óvulos estão com problemas na linha de montagem. E a notícia
repercute no corpo inteiro. O distúrbio atende pelo nome de ovários policísticos (SOP),
afeta entre 10% e 15% das mulheres e se manifesta na adolescência. "Ele
não tem uma causa específica, mas está associado ao aumento
desproporcional da produção de androgênio, o hormônio masculino", conta o
especialista em reprodução humana Jorge Haddad Filho, coordenador do
Programa de Reprodução Assistida da Universidade Federal de São Paulo.
"Questionar
se essa alta é o motivo ou a conseqüência do problema soa como a
pergunta sobre quem veio primeiro o ovo ou a galinha", completa. Pois é,
ainda há muito o que descobrir a respeito da SOP.
Mas a ciência desconfia que alterações genéticas estejam por trás dela.
Uma delas seria responsável pela chamada resistência à insulina,
hormônio que controla os níveis de açúcar no sangue. Esse distúrbio, por
sua vez, levaria a síndrome metabólica e um pacote de encrencas, como obesidade, gordura abdominal, colesterol e triglicérides alterados, pressão alta e diabete, capazes de levar a doenças cardiovasculares.
"Queremos
saber quais tratamentos ajudariam a evitar tanta complicação", diz a
ginecologista Carolina Sales Vieira, uma das coordenadoras de um estudo
do Hospital das Clínicas
da Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto, que, durante um ano,
vai avaliar 88 portadoras da SOP. Para o diagnóstico dessa síndrome os
especialistas recorrem a um exame de ultra-som, além de levar em conta sintomas como irregularidade do ciclo menstrual e aparecimento de características masculinas.
"Só
dá para afirmar que há SOP depois de dois anos da primeira menstruação,
porque antes disso as conexões entre ovários e cérebro ainda não estão
estabilizadas", explica Carolina. Nem todas as mulheres com ovários policísticos apresentam resistência à insulina, distúrbio que pode desencadear o diabete tipo 2 e levar ao entupimento de vasos sangüíneos.
"No
entanto, entre 30% e 50% das portadoras de SOP magras têm essa
disfunção hormonal", informa Carolina Sales Vieira. Já as estimativas em
relação às obesas sobem para algo entre 70% e 90%. Não à toa, a
obesidade é um dos fatores diretamente ligados aos ovários policísticos. E, como a alta de androgênio estimula o apetite, a perda de peso fica ainda mais difícil. "A SOP também contribui para a aterosclerose,
o bloqueio da passagem de sangue pelas artérias provocado por placas de
gordura", lembra o ginecologista Rui Ferriani, professor da USP de Ribeirão Preto, que também participa do estudo.
Felizmente, todos esses problemas dos pêlos em locais indevidos às complicações descritas acima, passando pela infertilidade
podem ser evitados ou combatidos. "Quando a paciente é acompanhada pelo
médico e faz o tratamento correto, pode perfeitamente engravidar e
ficar longe de riscos vinculados à síndrome metabólica e ao diabete",
afirma a hebiatra Andrea Hercowitz, professora da Faculdade de Medicina do ABC, na Grande São Paulo.
"Em
caso de resistência à insulina, receitamos medicamentos como a
metformina, que equilibra a síntese desse hormônio e ajuda a abaixar os
níveis de androgênio", acrescenta Jorge Haddad Filho. Só a droga, porém,
não basta. Mudar os (maus) hábitos é fundamental. "A jovem com ovários
policísticos deve praticar atividades físicas
regularmente e ter uma dieta equilibrada, o que também significa
reduzir o açúcar e a gordura", orienta Andrea. A SOP em si não tem cura,
mas o tratamento, aliado à adoção de um estilo de vida saudável, afasta
as encrencas.
Nunca é demais lembrar que as desordens típicas da
síndrome às vezes são confundidas com as alterações comuns nos primeiros
meses após a menarca a primeira menstruação tais como acne e ciclo
irregular. Daí a importância de detectar o problema precocemente. Tirar a
prova dos nove logo cedo é o caminho certeiro para garantir que o corpo
continue funcionando a todo vapor pela vida afora.
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