A privação do sono amplia transtornos de humor, como a ansiedade, e prejudica o aprendizado e a tomada de decisões.
Se você anda adotando estratégias erradas
no dia a dia, convivendo com desempenhos baixos e discutindo sem motivo
aparente, preste atenção no seu sono. Novas pesquisas confirmam que uma
noite maldormida destrambelha o processamento das emoções, compromete o
raciocínio e até debilita a memória.
Segundo um estudo do
Laboratório de Sono e Neuroimagem da Universidade de Berkeley, nos
Estados Unidos, indivíduos que passam pouco tempo na cama por apenas uma
noite já ficam mais aflitos do que o normal ao serem obrigados a
cumprir uma tarefa desafiadora. Exames de imagem retratam que a privação
do sono catapulta o impacto do estresse em áreas do cérebro
responsáveis pela atividade emocional, especialmente na amígdala,
estrutura relacionada a respostas negativas e a experiências
desagradáveis. Para as pessoas naturalmente ansiosas, o quadro pode ser
ainda pior.
"O equilíbrio dos sentimentos depende da qualidade
do sono, e vice-versa. Sem dormir direito, ocorrem alterações de
comportamento, já que a produção de neurotransmissores e hormônios fica
desregulada", afirma a neurologista Anna Karla Smith, do Instituto do
Sono, em São Paulo.
Uma das substâncias que vão às alturas
quando não dormimos bem atende pelo nome de cortisol. E esse hormônio é
conhecido por patrocinar o nervosismo ou até deflagrar uma crise de
ansiedade exacerbada. "Aliás, essa molécula aparece em altos níveis nos
pacientes com depressão. Talvez seja uma ligação química entre essa
doença e a insônia", sugere a bióloga Yara Fleury Van Der Molen, do
Ambulatório de Neuro-Sono da Universidade Federal de São Paulo.
Já
entre os neurotransmissores mais afetados pelo pouco tempo sob os
cobertores se destaca a serotonina, ligada ao bem-estar. Sem um número
adequado de horas dormidas, sua concentração no cérebro cai
drasticamente. Aí, surgem mais irritação e até sensações dolorosas.
Não
pregar os olhos abala inclusive nossas escolhas durante as refeições.
Em um segundo levantamento da Universidade de Berkeley, os pesquisadores
pediram a adultos que indicassem alguns alimentos de uma lista de 80
opções. Resultado: os voluntários privados de sono tendiam a preferir as
guloseimas menos saudáveis. E tem mais: com o auxílio de exames de
imagens, os cientistas verificaram que esses participantes apresentavam
falhas no lobo frontal, parte do cérebro responsável pela tomada
racional de decisões. Em outras palavras, muito provavelmente as poucas
horas sonhando atrapalham o desempenho cognitivo de uma forma geral, que
vai muito além da mesa de jantar.
De acordo com a neurologista
Rosa Hasan, do Departamento de Sono da Academia Brasileira de
Neurologia, em quem dorme pouco é possível notar uma maior dificuldade
para tomar decisões, manter o raciocínio e até mesmo para manter uma
conversação. "Determinadas ações, como dirigir, também ficam bastante
comprometidas. Se for necessário fazer alguma escolha rápida, a pessoa
terá sérios problemas", complementa.
O curioso é que essas panes
ainda implicam uma mente cada vez mais intranquila. "O sujeito tem a
concentração diminuída e uma probabilidade acentuada de cometer erros.
Quando percebe o equívoco, fica inseguro, e isso aumenta a ansiedade",
arremata Yara.
Dormir para aprender
Varar
a madrugada com o intuito de estudar, diga-se, é uma espécie de
autossabotagem, segundo uma pesquisa divulgada pela Universidade da
Califórnia em Los Angeles (Ucla), nos Estados Unidos. O estudo,
conduzido pelo psiquiatra Andrew J. Fuligni e sua equipe, analisou as
horas de estudo, as de sono e os resultados acadêmicos de 535 estudantes
americanos, e descobriu que os alunos que dormiam menos possuíam
dificuldade extra na compreensão de conteúdo passado pelo professor,
além de receber notas mais baixas em provas.
"A fase do sono que
fixa o aprendizado no cérebro é a REM, a dos sonhos e dos movimentos
oculares", ressalta o neurologista Shigeo Yonekura, do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. "É nela
que transformamos as memórias de curto em longo prazo", completa.
Acontece que chegar a esse estágio profundo - e permanecer nele -
demanda um bom tempo de cabeça apoiada no travesseiro. "Por isso,
privar-se de dormir facilita o esquecimento", analisa Yonekura.
O
artigo da Ucla ainda conclui que o sucesso acadêmico depende de uma
estratégia de estudos que não culmine em bocejos e mais bocejos no dia
seguinte. "Se for realmente necessário, sacrifique horas de outras
atividades menos importantes, mas nunca deixe de dormir", sugerem os
autores americanos no texto do trabalho.
Claro que não conseguir
apagar um ou outro dia é normal. A isso se dá o nome de insônia
eventual, aquela que surge quando você está muito preocupado ou até
animado. "Mas quem, por falta de sono, dorme duas horas a menos por mais
de cinco dias na semana, durante mais de três meses, pode ser
classificado como um insone crônico", adverte o pneumologista e
presidente da Associação Brasileira do Sono, Francisco Hora. Se esse for
seu caso, vale ir atrás de um especialista.
Agora, há também
aqueles que simplesmente se recusam a fechar as pálpebras já pesadas
porque querem ver uns minutinhos de televisão, ler o final de um
capítulo do livro ou decorar fórmulas para o exame final. Esse grupo,
que fique claro, não está livre dos efeitos da carência de horas
dormidas. Por isso é preciso se livrar dessas armadilhas. "O grande
remédio para uma vida longa, com bom humor e excelente cognição é uma
ótima noite de sono", aposta Hora. Você não será o único satisfeito ao
recarregar as energias de forma adequada. As pessoas que vivem ao seu
lado também agradecerão.
A triste face da insônia
Ficar
sem vontade de dormir pode ser sinal de depressão. Se essa situação não
é contornada, a tristeza profunda dificilmente desaparece. E, mesmo
quando ela some, a probabilidade de retornar é grande. Os
antidepressivos lidam com a melancolia e provocam sonolência, mas
precisam ser acompanhados de terapia para que questões emocionais,
possíveis causas de ambos os sintomas, sejam resolvidas.
A insônia e o Alzheimer
Pesquisadores
da Escola de Medicina da Universidade de Washington, nos Estados
Unidos, revelaram que os problemas para dormir podem ser um dos
primeiros sinais da doença de Alzheimer. Os estudos constataram uma
redução no tempo de sono de ratos que começaram a desenvolver, no
cérebro, placas da chamada proteína beta-amiloide, precursoras do mal.
Para turbinar o sono e a mente
A
meditação relaxa ao mesmo tempo que garante atenção nos momentos
necessários. Por isso, potencializa tanto o desempenho do cérebro no dia
como traz a vontade de dormir à noite. Já os exercícios, além de
causarem cansaço, o que ajuda a adormecer, estimulam os neurônios. Mas,
se praticados perto da hora de dormir, geram insônia.
Fonte: Revista saúde
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